quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Descobri. E agora?

O meu coração é pequeno para tudo o que sinto, para o que sou na maior parte das vezes. É pequeno para caber tudo o que é me dado. Meu coração é pequeno e é por isso que transbordo. Todos os sentimentos e emoções que não cabem arrumadinhas dentro dele, saem e espalham-se. Tranformam-se em cartas que escrevo, poesias que invento, palavras que jogo na cara, na minha e na dos outros. Querem transformar-se em alguma coisa para fora. Em serviço, em doação, em amor gratuito. Porque é demais só para mim e preciso partilhar. Dar á todos, dar aos que amo e dar também á qualquer um. O meu coração é pequeno para tanto e é por isso que transbordo. Sou uma ebulição de sentimentos, todos verdadeiros, todos doloridamente intensos, todos com um pouco de mim e um pouco de imensidão. Descobri agora a minha transparência, a minha urgência em dizer e fazer. Descobri agora o motivo da minha intensidade, da minha falta de contensão, e daquilo que chamam loucura. Descobri agora o porquê da minha vontade de saltar no escuro, voar para o desconhecido, entregar a alma. Descobri o que me leva a ser tão confiante e tão inconsequente ás vezes: meu coração. O meu coração não cabe só dentro de mim. O meu coração é o mundo inteiro. O mundo que cabe no meu abraço, o mundo onde chego e onde quero chegar.

"Onde está o teu tesouro, aí estará também o teu coração."

domingo, 17 de outubro de 2010

O tigre e a neve

Esse texto não pretende ter nenhum caráter crítico, até porque não saberia escrever uma crítica á altura e seria comprometedor demais falar de forma leviana sobre o filme.

Desprentesiosamente, partilho a minha opinião: é uma história fantástica, inspiradora, romântica, leve. Fala da vida, do amor, da guerra e da fé de uma maneira muito subtil e genuína. Conta-nos uma história de amor (muito diferente dos clichês habituais, com uma pitada de loucura e confusão) entre Attilio, poeta e professor universitário, e Victória, uma escritora que viaja para Bagdá durante a guerra entre os EUA e o Iraque.
Attilio pode parecer uma figura meio patética em algumas cenas, mas tornou-se uma inspiração para mim. Um homem louco, intenso, apaixonado e simples. Com alma de poeta, um sotaque irresistível e muita vontade de viver.
Essa semana, acordei num dia chuvoso e frio, com olheiras e sono, mil coisas marcadas na agenda e sem vontade nenhuma de levantar da cama. Sem querer, me lembrei dele e da cena do filme que partilho aqui em baixo.



Acho que é disso que precisamos: paixão! Viver a vida com amor, com poesia. Fazer da vida uma poesia. Nos encantarmos por coisas simples. Lutar pelo que acreditamos. Acreditar nos sonhos, acreditar em sonhos grandes! Precisamos ser feliz. Precisamos ser feliz para tudo, até para estar triste. E pensando bem, a vida não passa disso mesmo: a procura e o encontro com a felicidade.

P.s. Peço desculpa por não ter legenda, mas não encontrei a versão legendada. Fica aqui algumas notas de tradução das mensagens mais importantes:

"Apaixonem-se! Se não nos apaixonamos, fica tudo morto!"
"Espalha alegria. Mas se tiveres triste, que seja com exuberância."
"Para transmitir felicidade, é preciso ser feliz. Para transmitir dor, é preciso ser feliz. Não se preocupem com o sofrimento, todo mundo sofre! [...]"

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

O menino da livraria

Trocaram olhares enquanto ela descia as escadas para uma espécie de subsolo da casa. Era uma mulher normal, bonita como qualquer mulher. Estava usando um vestido preto e salto alto. Camila, o nome dela. Rodrigo usava uma calça jeans velha e uma camisa preta. Estava arrumando a prateleira e ouvia uma música estranha. Ela tinha o hábito de visitar livrarias mas aquela vez tinha sido conscidência. Ia a caminho de uma confeitaria para encontrar uma amiga. Distraiu-se no volante e foi parar ali, numa rua sem saída. Aproveitou o engano para parar o carro e ir espreitar. Ele estava meio entediado com aquela sexta-feira chuvosa e vazia. Tinha um olhar penetrante, um ar intelectual, misterioso. Ela sempre achou os meninos das livrarias interessantes. E ele gostava de loiras que lessem Dostóiesvki. Trocaram olhares pela segunda vez. Estavam sozinhos. Para além deles, apenas os personagens de Saramago e os heterónimos de Pessoa. O lugar era acolhededor, tinha cheiro de livro novo misturado a um perfume qualquer. Enquanto ela folheava os destaques: romances e best-sellers fora de moda, ele mudou a música, criou coragem e ofereceu ajuda. Ela sorriu e disse que procurava obras de Inês Pedrosa. Enquanto procuravam, ficavam amigos. Até descobriram gostos parecidos, em menos de quinze minutos. Não havia o livro que ela queria, mas ele mostrou outros poetas. Disse que encomendava o livro para ela ir buscá-lo outro dia. Camila deixou nome e telefone e aaiu com pressa, sem comprar nada. Rodrigo ficou com a sensação que tinha encontrado quem procurava.

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Martha Medeiros


Já fui de esconder o que sentia, e sofri com isso. Hoje não escondo nada do que sinto e penso, e às vezes também sofro com isso, mas ao menos não compactuo mais com um tipo de silêncio nocivo: o silêncio que tortura o outro, que confunde, o silêncio a fim de manter o poder num relacionamento. [...]
Como é fácil libertar alguém de seus fantasmas e, libertando-o, abrir uma possibilidade de tê-lo de volta, mais inteiro. Falar o que se sente é considerado uma fraqueza. Ao sermos absolutamente sinceros, a vulnerabilidade se instala. Perde-se o mistério que nos veste tão bem, ficamos nus. E não é esse tipo de nudez que nos atrai. Se a verdade pode parecer perturbadora para quem fala, é extremamente libertadora para quem ouve. É como se uma mão gigantesca varresse num segundo todas as nossas dúvidas. Finalmente, se sabe. Mas sabe-se o quê? O que todos nós, no fundo, queremos saber: se somos amados. Tão banal, não? E no entanto essa banalidade é fomentadora das maiores carências, de traumas que nos aleijam, nos paralisam e nos afastam das pessoas que nos são mais caras. Porque a dificuldade de dizer para alguém o quanto ela é - ou foi - importante? Dizer não como recurso de sedução, mas como um ato de generosidade, dizer sem esperar nada em troca. Dizer, simplesmente. A maioria das relações - entre amantes, entre pais e filhos, e mesmo entre amigos - se ampara em mentiras parciais e verdades pela metade. Pode-se passar anos ao lado de alguém falando coisas inteligentes, citando poemas, esbanjando presença de espírito, sem ter a delicadeza de fazer a aguardada declaração que daria ao outro uma certeza e, com a certeza, a liberdade. [...] Somos sádicos e avaros ao economizar nossos "eu te perdôo", "eu te compreendo", "eu te aceito como és" e o nosso mais profundo "eu te amo" - não o "eu te amo" dito às pressas no final de uma ligação telefônica, por força do hábito, e sim o "eu te amo" que significa: "Seja feliz da maneira que você escolher, meu sentimento permanecerá o mesmo". Libertar uma pessoa pode levar menos de um minuto. Mais que as mentiras, o silêncio é que é a verdadeira arma letal das relações humanas.

Martha Medeiros, do livro "Doidas e Santas"

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Para quem não gosta do que faz...


Á minha volta, cinco mesas, cinco homens de negócios. Na minha mesa, uma pilha de papéis com estatísticas, gráficos, análises macroecónomicas. Eu juro que estava a adorar o meu monte de números. Estava, até perceber que não ia conseguir despachá-los tão rapidamente quanto gostaria. O mercado de trabalho é duro. O mercado dos estagiários, se existisse tal terminologia, é ainda pior. Além de trabalhar mais, a conta bancária não vê cifrões (no caso, euros) no fim do mês. Então, aonde buscar a motivação quando não se gosta do que se faz?

Cada vez que me conheço melhor, me assuto mais com a minha necessidade em apaixonar-me pelas coisas que me envolvem. Sinto que isso faz toda a diferença quando a questão é dar tudo e fazer o meu melhor. Mas quando isso não é possível (e ás vezes, não é mesmo!) tento encontrar, insistentemente, o lado bom da situação. E caso não haja, há, pelo menos, qualquer coisa cómica para contar. (Por exemplo, é cómico chegar segunda-feira no escritório e falar sobre futebol com os colegas de trabalho, porque é o único assunto com o qual se pode manter uma conversa. Mesmo quando não se entende nada sobre futebol.)
A teoria da relatividade também tem me ajudado. Afinal, é tudo uma questão de "olhos", olhar e ver que nada é definitivo, nada é totalmente desesperante e absolutamente nada é capaz de me fazer parar! (E agora, como plano de fundo começa a música "é melhor ser alegre que ser triste..." cantada pela voz do meu pai, batucando na mesa da cozinha e repetindo a mesma frase durante a música toda. Dá até para me sentir motivada com isso!)

Nesse momento da minha vida, a minha motivação prende-se no futuro, o que não torna as coisas mais leves, por incrível que pareça. Continuo fazendo contas, mesmo quando não se trata do trabalho. Conto as horas, os dias e os meses que faltam para os meus dias melhores. Daqui a dois meses, me despeço da empresa. Daqui a oito meses, me despeço da faculdade e... haverá ainda outra despedida.

P.s. Se isso fosse um diário (ainda bem que não é, exatamente!) acreditem que eu não escolheria tão bem as palavras e as frases para manifestar insastifação momentânea.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

O Inverno na vida

Menos sete graus na temperatura habitual. A chuva bate forte na janela, o vento canta sozinho do lado de fora, chamando a atenção. Casacos e guardas-chuva voltam para o armário do dia-a-dia. O céu transforma-se em cinza, as nuvens encobrem os pássaros e a arquitectura histórica da cidade (do Porto, nesse caso) ganha uma beleza diferente.
Acabaram-se os dias de sol, não se sabe quando vão voltar. Já não tem a mesma graça passear á beira-mar. A Foz do Douro quase perde o seu encanto. Troca-se as ruas pelo aconchegante sofá de casa. Os encontros de verão e as viagens à Costa, pelo estudo intensivo ou no máximo, por filmes clássicos debaixo do cobertor. É a altura certa para se deixar embalar por Bob Dylan, Zeppelin ou até Pink Floyd. É a altura certa para hibernar o pensamento em longas conclusões sobre a vida, sobre o futuro, sobre coisas sérias que ninguém gosta de dar muita importância, inclusive eu.
Acho que o inverno existe na vida interior também. Um tempo mais calmo e ao mesmo tempo mais propicio à grandes mudanças. O que pode ser consolador ou uma verdadeira avalanche. Pessoalmente o que sinto é que aproxima-se uma grande revolução! O meu inverno interior será intenso, cheio de decisões, de planos e de emoções á mistura. Se eu não fosse eu, diria que o que importa agora é manter a cabeça ocupada, focada e sem espaço para grandes desvios. No fundo, acho que seria a melhor opção: segurar tudo num limite exacto de controlo e objectividade. Mas... e se eu quiser me deixar transformar num campo de batalha onde caibam toda a minha loucura e seriedade?

sábado, 2 de outubro de 2010

Nota da emoção

Sentia o coração pular no peito. As pernas tremeram, as mãos suaram. Sem sentir, uma lágrima discreta escorregou pelo rosto. Do lado de dentro, um vazio gigante chamado saudade. Do lado de fora, o ipod tocava as mesmas músicas e o colo do irmão curaria quase tudo. Sem encontrar nenhum motivo que justificasse tal ilusão, deixou-se estar. Vuou, voltou. Vuou e voltou. Vuou de novo e há de ser sempre assim. Solenidade e risco. Sereno e fogo. Passado e futuro. Coração e razão. Maturidade e sonho. E um limite térnue que vai do sentimento á realidade, e ao sentimento verdadeiro que já não existe.

Um dia há se ser só poesia, como diria o senhor da Viola, é assim que o samba vem, carregado de saudade e emoção.