quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Desapego é foda!

Eu tenho uma certa dificuldade em me afastar das pessoas sem um motivo plausível (e com um motivo também) porque eu realmente acredito que ninguém se encontra por acaso. Mas isso é outra história. Eu estou tentando e isso já é um sinal enorme de aceitação da minha parte, não fiz nada para mudar ou impedir, me conformei. Logo eu que sempre achei que se conformar com algo que não se deseja é coisa de gente fraca! Tudo bem, aceitei com a desculpa de estar praticando o desapego. Afinal, durante toda a vida, há pessoas indo e vindo e parando para pensar, não é tão ruim assim. Mas eu confesso: gostaria de ter evitado tal constrangimento! Porque ficar nessa preocupação irritante, nesse exercício de lógica, nessa concentração inútil para não aliviar o estômago de uma vez e te mostrar que eu estou aqui e sou de confiança... é uma sacanagem!

Se quiser mesmo saber

Você quer mesmo saber? Eu acho uma treta essa regra de não invadir espaços nem zona de conforto alheia. Não ultrapassar limites, não desrespeitar decisões. Não pisar o risco, não quebrar o silêncio, a razão, o porta-retrato. Manter a distância, o respeito, o equilíbrio. Essa farsa de exibir uma postura erecta e um ar de segurança não funciona nem nas novelas e todos os filmes que ganharam o Óscar se aproveitaram de lágrimas que todo mundo esconde debaixo da vergonha. Você quer mesmo saber? Acho uma treta fazer tudo certo, não incomodar ninguém e seguir ao sabor do vento, como se a tranquilidade pudesse ser adquirida em qualquer loja de conveniência. Ninguém lembra do que não faz doer, não faz sonhar, não faz morrer de dúvida, de vergonha ou de felicidade. Ninguém pára no meio do caminho, no meio da oração, do filme, do orgasmo. O quase, morno, mais ou menos e o nem tanto assim é uma invenção imbecil dos covardes. E tenho dito.

Vida interior

O que a gente faz com tudo o que não diz, não vive, não acontece? O que a gente faz quando não é permitido abraçar, proteger, cuidar de quem a gente gosta? O que a gente faz com todos os sentimentos que não são digeridos, que ficam batendo na porta dos pensamentos insistentemente, querendo sair, querendo explodir de uma vez por todas? Me diga, o que a gente faz com um coração que não nos deixa em paz? Guardamos tudo. Vira vida interior. E depois nos contorcemos em aguentar o peso de dentro ao mesmo tempo que parecemos normais, simpáticos, sorridentes e equilibrados. E é um saco ter que sobreviver em duas vidas paralelas.

terça-feira, 23 de agosto de 2011

Cada um tem o seu

Acho que todos nós temos um defeito, dos mais graves da nossa colecção, com o qual temos de lutar a vida toda. O pior dos meus é o apego, essa mania de mergulhar de cabeça sem pará-quedas, máscara de oxigênio ou qualquer tipo de protecção. O problema é que o defeito do resto do mundo é ser bem mais esperto do que eu.

sábado, 20 de agosto de 2011

Não existe mais ou menos

Eu gosto de ser incomodada. Gosto que me tirem o fôlego, me deixem constrangida, nervosa, agitada. Eu gosto dos pingos nos is, do celular em cima da mesa, das mentiras espalhadas pelo chão. Gosto de gritos, gemidos e música alta. Gosto de quem despe a alma de preconceitos, medos e traumas e de quem joga na cara o que pensa sem pesar. Eu gosto dos extremos. Porque ninguém é bonito mais ou menos, simpático mais ou menos. Muito menos, feliz mais ou menos! Os equilibrados que me perdoem, mas eu prefiro a confusão. Nada de economia, jogos de sedução, cartas pela metade, "eu te amos" sem emoção, sorrisos amarelos, entrelinhas, silêncios prolongados. Essa vida acontece tão de repente que é um desperdício esperar. É um desperdício manter a pose, contrariar o coração, evitar o risco! Acho extremamente irritante que não se permite, quem fica medindo os sentimentos e as palavras como se tratasse de encontrar uma fórmula contra a vulnerabilidade. Quem não se conhece vulnerável, não conhece a delícia de se sentir protegido! Acho realmente uma perda de oportunidade essa gente que prende o riso, o suspiro, segura a lágrima e vive só de razão. Tenho preguiça de quem não comete erros, gafes, indelicadezas. Para quê estamos aqui, afinal?

Fabrício Carpinejar

Não seja sério; a seriedade é duvidosa; seja alegre; a alegria é interrogativa. Quem ri não devolve o ar que respira. Não atravesse o corpo na faixa de segurança. Grite para o vizinho que você não suporta mais não ser incomodado. Desista da agenda, dos papéis amarelos, de qualquer informação que não seja um bilhete de trem. Procure falar o que não vem à cabeça. Cantarolar uma música ainda sem letra. Seja imprudente porque, quando se anda em linha reta, não há histórias para contar. Leve uma árvore para passear. Não espere as segundas intenções para chegar às primeiras. Ligue sem motivo para o amigo, leia o livro sem procurar coerência, ame sem pedir contrato, esqueça de ser o que os outros esperam para ser os outros em você. Alterne a respiração com um beijo. Volte tarde. Dispense o casaco para se gripar. Solte palavrão para valorizar depois cada palavra de afeto. Complique o que é muito simples. Conte uma piada sem rir antes. Cometa bobagens. Ninguém lembra do que foi normal. Que as suas lembranças não sejam o que ficou por dizer. É preferível a coragem da mentira à covardia da verdade.

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

O sexo frágil



A gente lê de tudo. Se entope de informação, de maquiagem e perfume. A gente cresce com os exemplos de nossas mãe e avós. Ouvimos as histórias sem finais felizes várias vezes e adoramos dar um conselho pra qualquer amiga apaixonada. A gente sabe analisar todos os filmes de Woody Allen e possuímos a discografia do B.B. King na estante de casa, junto com os manuais de psicologia, as poesias de Pessoa e revistas de moda.
Nós fazemos depilação definitiva e amizade com a pinça. Fazemos o almoço, a cama e o melhor brigadeiro da vizinhança. Nós fazemos de tudo para nos equilibrar no salto alto, no sorriso largo e na vida louca de todos os dias. Pagamos as contas. Somos espertas, desencanadas, bonitas e independentes! Aprendemos a consertar lâmpadas e matar baratas. Somos charmosas mesmo quando fazemos jogging ou limpamos a casa!
Mas mesmo sendo maravilhosas sozinhas, vivemos para encontrar o amor. E somos incríveis todos os dias, para ver se ele chega mais depressa! Sem segredos: a gente adora ter alguém para contar a história do romance da nossa cabeceira; alguém para aprovar a maquiagem e o perfume novo; alguém que nos faça esquecer as histórias que deram errado e todas as teorias que inventamos sobre os relacionamentos! A gente se derrete com quem sabe rir do humor de Allen e dizer uma gracinha embalada ao som de "You are my sunshine". Gostamos mesmo de ficar bonita para alguém especial; dormir de conchinha; dividir a conta, a cama e o dia! Sim, nós ainda sonhamos com os contos de fadas que nos contaram na infância, com a casa, o jardim, os filhos num baloiço, uma vida simples e feliz ao lado de um príncipe encantado. Talvez por isso, ainda nos considerem o sexo frágil.

Fabrício Carpinejar

Um dia li uma frase: "nada de grande se faz sem paixão". Mas nada de pequeno se faz sem amor. A paixão testa, o amor prova. A paixão acelera, o amor retarda. A paixão repete o corpo, o amor cria o corpo. A paixão incrimina, o amor perdoa. A paixão convence, o amor dissuade. A paixão é desejo da vaidade, o amor é a vaidade do desejo. A paixão não pensa, o amor pesa. A paixão vasculha o que o amor descobre. A paixão não aceita testemunhas, o amor é testemunha. A paixão facilita o encontro, o amor dificulta. A paixão não se prepara, o amor demora para falar. A paixão começa rápido, o amor não termina.
Não me dou paz sequer um segundo. Até a minha insegurança é amor. Sofro incompetência natural para medir a linguagem das laranjas, acredito desde pequeno que tudo o que cabe na mão me pertence. Minha lareira não dura uma noite, esqueço da reposição das achas, do envolvimento da lenha no jornal, de assoprar o fundo. Brigo com o bom senso. Ou sinto calor demais ou sinto frio demais. Uma ânsia de ser feliz maior do que a coordenação dos braços. Um arroubo de abraçar e de se repartir, de se fazer conhecer, que assusta. Esse sou eu: que vai pela esperança da volta.

Fabrício Carpinejar

"Meu maior medo é viver sozinho e não ter fé para receber um mundo diferente e não ter paz para se despedir. Meu maior medo é almoçar sozinho, jantar sozinho e me esforçar em me manter ocupado para não provocar compaixão dos garçons. Meu maior medo é ajudar as pessoas porque não sei me ajudar. Meu maior medo é desperdiçar espaço em uma cama de casal, sem acordar durante a chuva mais revolta, sem adormecer diante da chuva mais branda. Meu maior medo é a necessidade de ligar a tevê enquanto tomo banho. Meu maior medo é conversar com o rádio em engarrafamento. Meu maior medo é enfrentar um final de semana sozinho depois de ouvir os programas de meus colegas de trabalho. Meu maior medo é a segunda-feira e me calar para não parecer estranho e anti-social. Meu maior medo é escavar a noite para encontrar um par e voltar mais solteiro do que antes. Meu maior medo é não conseguir acabar uma cerveja sozinho. Meu maior medo é a indecisão ao escolher um presente para mim. Meu maior medo é a expectativa de dar certo na família, que não me deixa ao menos dar errado. Meu maior medo é escutar uma música, entender a letra e faltar uma companhia para concordar comigo. Meu maior medo é que a metade do rosto que apanho com a mão seja convencida a partir com a metade do rosto que não alcanço. Meu maior medo é escrever para não pensar."